O tempo da obra de arte


Às vezes apetecia-me ter aquele género de erudição que me permitisse sem esforço convocar diversos autores à volta de um tema.

- Demoras muito tempo a escrever um romance?
- Escrevê-lo em si não. É um processo bastante rápido. Em menos de dois anos escrevi Cem anos de Solidão. Mas antes de me sentar à máquina demorei quinze ou dezassete anos a pensar nesse livro.
- E demoraste um tempo igual amadurecendo O Outono do Patriarca. Quantos anos esperaste para escrever a Crónica de Uma Morte Anunciada?
- Trinta anos.

(in O Aroma Goiaba, Gabriel Garcia Marquez e Plínio Apuleyo Mendonza)

Entre as muitas virtudes de Chuang-Tsu contava-se a habilidade para o desenho. O rei pediu-lhe que desenhasse um caranguejo. Chuang-Tsu disse que precisava de cinco anos de tempo e de uma residência com doze criados. Passados cinco anos o desenho não estava ainda começado. “Preciso de mais cinco anos” disse Chuang-Tsu. O rei concedeu-lhos. Ao fim dos dez anos, Chang-Tsu pegou no pincel e num instante, com um único traço, desenhou um caranguejo, o caranguejo mais perfeito que jamais se tinha visto.

(in Seis propostas para o próximo milénio, Italo Calvino)